sábado, 5 de março de 2011

As quatro citações mais populares (e mal interpretadas) da filosofia

Existem algumas citações do campo da filosofia que se tornaram muito pop's, famosas mesmo. É bom que a filosofia se torne famosa, entretanto, é ruim quando queremos entender a filosofia por frases soltas, na base do "ouvi falar". Pior ainda é quando citamos essas frases sem entendê-las. Aqui vão as quatro frases mais famosas, e mal interpretadas, da filosofia, seguidas de uma tentativa de esclarecimento e contextualização para que não fiquem tão soltas por aí:

“A religião é o ópio do povo” K. Marx – Essa citação de Marx, não raro, é interpretada de forma equivocada. Muitos a entendem com o sentido de que a religião manipula e ilude o povo, como a ilusão criada por se fumar ópio. Entretanto, essa não é uma interpretação coerente nem no contexto em que a frase foi posta, nem segundo o próprio pensamento de Marx. Para o Marxismo, tendo como base o materialismo histórico, não é a consciência que determina aquilo que é material, mas sim o que é material que determina a consciência. Aqui, o verbo determinar não deve ser entendido de forma rígida, determinista, afinal, apesar da predominância do material sobre a consciência, Marx concebe a relação entre o material e as ideias como dialética. Sendo assim, a religião, tida como ópio, faz parte do campo da consciência e não do campo material. Não é ela que cria a ilusão que determina a miséria do povo; ela, na realidade, é o resultado das miseráveis condições materiais pelas quais o povo sofre. Marx, aqui, talvez apontasse que a religião é antes uma consequência da exploração do trabalhador, do que sua causa. Oprimido materialmente, o povo busca dar conta de seu sofrimento através do alívio da consciência, com o ópio, ou seja, com a religião. Aqui vai a frase com um pouco mais de contexto:  “A religião é o suspiro da criatura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração e a alma de situações sem alma. A religião é o ópio do povo.

“Só sei que nada sei” Sócrates – O problema que existe na interpretação dessa frase atribuída a Sócrates (ela surge pelos escritos de Platão e não se sabe se Sócrates fez tal afirmação ipsis litteris), na verdade, está nas relações que acabamos estabelecendo entre ela e outras coisas que não eram cabíveis na antiga Grécia. O filósofo Paulo Ghiraldelli Jr. denuncia essa má relação que fazemos entre essa sentença, no contexto em que ela surgiu, e a humildade. Ora, a noção de humildade é cristã, não existia na antiga Grécia. Quando Sócrates possivelmente coloca que só sabia que nada sabia (ou "que não sabia nada sobre o que perguntava ao atenienses"), isso foi antes uma afirmação de inteligência, da qual Sócrates tinha orgulho, do que de humildade. Sócrates queria dizer que como filósofo ele só poderia ser amante da sabedoria, mas sábio mesmo, só os deuses, pois somente eles podiam saber das coisas que Sócrates perguntava na praça (justiça, piedade, coragem), ficando para o filósofo uma única certeza: a de que nada sabia sobre essas coisas.

Deus está morto” F. Nietzsche – Essa talvez seja a frase mais mal interpretada de toda a filosofia. Isso porque ela, como a frase de Marx, cita algo que faz parte do campo da religião. Entretanto, de nada adianta querer entender frases soltas. Nietzsche era um grande crítico da metafísica, e consequentemente da metafísica de Platão, e, com essa frase, queria mais constatar que as justificativas e fundamentos que damos para nossa existência em um “além-mundo” estavam mortas, do que fazer propaganda do ateísmo. Nietzsche estava atestando, no final das contas, que a metafísica (Deus) morreu. E quem foi o assassino? O positivismo. Depois dele, não poderiamos mais julgar nosso mundo segundo preceitos metafísicos e, no final das contas, sabendo disso, todos nós “matamos Deus”. “Deus está morto! Deus permanece morto! E quem o matou fomos nós!

“O inferno são os outros” J. P. Sartre – Essa frase, sozinha, sem o devido contexto da filosofia Sartriana, dá brecha para se pensar que seria melhor se os “outros” não existissem para atrapalhar a mim, o mundo, ou qualquer coisa do tipo. Entretanto, isso não se encaixa na filosofia de Sartre. Ora, o existencialismo é aquela filosofia em que a existência precede a essência. Em outras palavras, antes existimos do que somos e nossa essência não é pré-concebida. A essência de cada um de nós é resultada da nossa existência, das nossas escolhas durante a vida. Ou seja, eu, como ser humano, sou as escolhas que tomo durante a minha vida e, no fim das contas, é isso que me difere das outras coisas: a liberdade. “O ser humano está condenado a liberdade”, segundo Sartre, porque não pode escapar de sua responsabilidade de decidir. Ao tomar uma decisão, o ser humano deve sofrer a angústia da escolha e ser responsável por si mesmo e por toda a humanidade. Se não for assim, não é verdadeiramente livre. E como o ser humano pode ter acesso e experimentar a sua própria essência? A partir do outro, da convivência. O inferno é esse. Além de estar condenado à liberdade, tendo que fazer escolhas sob minha responsabilidade, os outros me impedem de fazer tudo que quero, entretanto, é somente através dos outros que posso vislumbrar minha essência; somente através do “inferno” da convivência e da condenação à liberdade que os seres humanos podem ser.

3 comentários:

  1. Vale lembrar que o que Sócrates disse na verdade foi "Quando não sei, não penso que sei". Que por algum motivo, virou o famoso "Só sei que nada sei".

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  2. Boa observação, Renan. Valeu uma correção no texto. Na realidade, como Sócrates nunca deixou algo escrito sobre sua filosofia (ele escreveu outras coisas), não se sabe literalmente o que ele disse. O "só sei que nada sei" nos vem pelos escritos de Platão sobre Sócrates.

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  3. Três poderes paralelos.

    A democracia tem seu equilíbrio nos três poderes, Executivo, legislativo e judiciário. Quando a democracia está realmente dentro de um espírito democrático existe também o quarto poder que é a imprensa, onde são divulgados sem censura os erros e acertos dos governantes.
    Paralelamente a estes três poderes do regime democrático existem outros três poderes, são eles: poder econômico, político e religioso, naturalmente estes poderes por interesses próprio estão intimamente ligados formando um tripé o qual da sustentação a todo tipo de manipulação do povo brasileiro.
    Primeiro falaremos do poder econômico, todos sabem, em país de terceiro mundo o dinheiro compra tudo, então para os poderosos tudo é possível, nada os impede de manipular qualquer setor da vida nacional.
    Segundo, o poder político, este é sustentado pelo poder econômico e costumeiramente muito bem apoiado pelo poder religioso, que tem a incumbência de manipular a classe mais humilde da população proporcionando aos políticos desonestos a possibilidade de se manterem sempre exercendo cargos públicos sem serem questionados ou importunados.
    Terceiro, poder religioso, a meu ver o maior manipulador das classes menos favorecidas. A manipulação religiosa é que mantém o povo sempre tranqüilo, esperançoso e sempre acreditando na promessa de que na vida eterna, é que está a verdadeira felicidade.
    Dizem eles: Não se preocupem com riqueza, pois é mais fácil um camelo passar no fundo de uma agulha do que um rico entrar no céu. (E quem falou que rico quer entrar no céu). Os teocratas Alardeiam com muita ênfase, a glorificação, e as delicias do paraíso, tudo isso vem após a morte, sendo assim os fieis religiosos mantém-se calmos, tranqüilos e cordatos sem desejo de reação contra os desmandos do poder político e do poder econômico.
    Para finalizar, tenho ouvido muitos falarem que religião é o freio da humanidade. Não concordo, pois o verdadeiro freio que deveria existir na humanidade é a responsabilidade dos pais de educarem seus filhos os ensinando a serem honestos, trabalhadores, sobretudo ter grande respeito pelos seus semelhantes. Mas ao invés disso os pais na sua maioria ensinam aos filhos fantasias de que existe inferno, paraíso, pecado e sem questionamento devem sempre temer a Deus. Estes ensinamentos são fantasiosos, pois nem mesmo eles sabem com certeza se realmente existe. A meu ver a religiosidade do povo no planeta todo não regride pelo fato da maioria dos pais passarem para seus filhos suas crenças herdadas dos seus antepassados. Na verdade é isso que sustenta a continuação da fé religiosa. Dizem que a religiosidade é uma manifestação divina no ser humano, digo com toda certeza se não existisse o medo da morte, se vivêssemos para sempre, a palavra religião nem faria parte do nosso dicionário.

    Paulo Luiz Mendonça.

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