terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

É namoro ou amizade?

Nós temos variadas maneiras de pensar e classificar o amor. Os antigos gregos, já sabendo que não da para colocar o amor entre amigos no mesmo guarda-chuva do amor romântico, entre casais, diferenciaram philia de eros. Isso pode nos levar a pensar que, desde a antiguidade, o amor (entre casais) é uma coisa, e a amizade é outra.

Em nossos tempos, em nosso dia-a-dia, nos programas de TV, uma pergunta que nos parece tão banal vem, de certa forma, representar essa cisão entre amantes e amigos: “é namoro ou amizade?”. Ora, esse “ou” não é aditivo. Não é ou namoro, ou amizade, ou os dois. Esse “ou” é excludente e sabemos muito bem disso: ou é namoro, ou é amizade. Na verdade, quando se trata de programas de TV, acaba sendo nenhum dos dois. Daquela escolha do participante não necessariamente nascerá um namoro, envolvendo o amor eros, e muito menos uma amizade. No caso do programa de TV, talvez fosse melhor perguntar “Fica ou não fica?”; assim, ninguém estaria traindo eros e nem philia, falando de amores que não estão ali.

Outro aspecto de nosso cotidiano que aponta para cisão entre o amor (de casais) e a amizade é a própria forma como dizemos que nos relacionamos, nossos conselhos amorosos e sabedoria adquirida da vivencia. Temos um grande pé atrás quanto à amizade entre sexos opostos. Aconselhamos nossos amigos e amigas que, para conquistarem a pessoa desejada, não entrem em uma amizade com ela, “virou amigo, fudeu!”. A distinção entre o namoro e a amizade é até utilizada nos rompimentos: “eu gosto de você, mas como amigo”. Mais uma vez reforçamos que amantes são amantes, e amigos são amigos. Será que isso tem nos ajudado a construir bons relacionamentos amorosos?

Claro, podemos até culpar o liberalismo, quando esse deu margem para o individualismo, pelas nossas dificuldades de se relacionar com os outros. Estando nossa liberdade assegurada, como indivíduos, ganhamos um grande presente que dá margem para que pensemos sempre mais em nossas vontades do que na vontade do outro, e é isso que acabaria com os relacionamentos amorosos. Porém, acho que essa nossa forma de pensar os amores, excludente, também contribui para esse show de rompimentos e divórcios que vemos todos os dias. Se a amizade, amor philia, é aquele que quer ver a felicidade do outro sob certas condições (confiança, fidelidade), porque bons amantes não podem ser pensados também como amigos? Quando presenciamos relacionamentos duradouros, ou até amigos que viraram grandes amantes, será que não há algo de amizade ali no meio?

Alguns filósofos já pensam os bons relacionamentos amorosos como uma junção entre eros e philia. Outros, defendem que eros não deve ser pensando como um amor egoísta, no sentido que só se busca a autossatisfação. Isso significa dizer que quando faço sexo com minha namorada, meu objetivo não é só o meu prazer, mas também dar prazer a ela. No dia-a-dia, quero vê-la feliz e me movimento, promovo ações para isso. Em outras palavras, os amantes não se tratam apenas como meio de se proporcionarem prazer, mas também tratam o outro como fim, buscam a felicidade do outro. Caso não seja assim, não é amor. Aí, para o filósofo que defende que eros também é querer o outro bem, o que diferenciaria o amor romântico da amizade é o ciúme que envolve a posse.

Portanto, seja pensando os bons relacionamentos como uma junção entre eros e philia, seja pensando o amor eros como aquele que também trata o amado como fim, e não só como meio, todo amor tem uma pitadinha de amizade. Isso não significa dizer que a amizade entre sexo opostos é uma mentira, afinal, se não há eros, se não existe o desejo, não pode haver romance e as pessoas podem se gostar mesmo assim. Tão pouco significa dizer que, necessariamente, se duas pessoas estão juntas, elas se amam. Afinal, pode haver o desejo e nada de amizade, nada de querer ver o outro bem. Nesse sentido, eu ainda tenho fé de que se sentimos um desejo pelo outro, temos e quisermos ser bons amantes, devemos saber, antes de tudo, sermos bons amigos.

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