domingo, 10 de outubro de 2010

A melhor desculpa de todas

Foi convidado para uma festa que não quer ir? Cobrado por um trabalho que não fez? Aquela pessoa que você não está afim, mas fica insistindo pra vocês saírem, te jogou na parede com mais um convite e você gostaria de sutilmente recusar? Ora, a melhor forma de se desfazer de tudo isso é com uma desculpa. Mas não qualquer desculpa. Tem que ser uma desculpa estratégica, eficiente, efetiva e eficaz. Uma desculpa que realmente funcione no mundo contemporâneo globalizado. Qual é a melhor desculpa de todas, atualmente? A desculpa com maior probabilidade de funcionar?

“Não tenho tempo”.

No mundo de hoje, é muito fácil aceitarmos a falta de tempo. Caso falte para nós uma desculpa especifica para uma determinada ocasião, “não tenho tempo” é a carta na manga; é o coringa do baralho das desculpas do século XXI. Podemos dizer que alguns de nós realmente não têm tempo e outros somente acham, ou bravejam, que não têm. Isso não importa. Não importa, para o funcionamento dessa desculpa, se verdadeiramente temos tempo ou não. O fato é que essa desculpa funciona mesmo quando temos tempo e ela não passa de uma desculpa. Mas, por que ela funciona tão bem?

Funciona, provavelmente, porque desde as reformas protestantes, e das revoluções burguesas liberais, não só se deu um ponta-pé a respeito da idéia de liberdade do indivíduo, de se definir pela sua vida terrena, como também se fortaleceu a relação entre trabalho e dignidade. Sendo assim, nesse contexto, o individuo não se define pelo seu parentesco, mas sim pelo seu trabalho. O burguês não mais precisava se preocupar em não ser reconhecido por não ter nascido nobre. Tudo que ele precisava era trabalhar o bastante para ser alguém. Hoje, essa idéia ainda perdura. É dentro dessa perspectiva que continuamos a associar tanto valor ao trabalho. Só pode ser alguém quem trabalha. E quanto mais se trabalha, melhor. Sendo assim, tendemos a acreditar que quanto menos tempo uma pessoa tem, por conta de mais trabalho, mais digna ela é.

Somos tão ligados à idéia de “falta de tempo”, e de como essa falta deve ser obrigatória na vida das pessoas, que se alguém nos diz ter tempo, pois não vai fazer nada na quarta-feira a tarde, achamos estranho. Logo fazemos observações sarcásticas do tipo: “eee vida boa, eim!” ou “tá folgado... Trabalhar que é bom, nada, né?”. No mundo de hoje, o normal é não ter tempo. Se se tem tempo, achamos que algo deve estar errado. E pior, achamos que o mundo sempre foi assim. Naturalizamos a idéia do ócio como “oficina do diabo” e do trabalho como poço da dignidade. Sendo assim, aceitamos que não ter tempo é uma boa desculpa, pois isso significa que não estamos ociosos, que estamos trabalhando e, portanto, somos dignos. Por isso, dizer que alguém tem tempo de sobra é, não raro, uma ofensa.

Contudo, será que “não ter tempo”, o que significa estar trabalhando a maior parte do tempo, é sempre algo positivo? Até certo ponto o trabalho dignifica, mas em que momento ele deixa de ser dignificante e se torna exploração, seja por parte dos outros, seja de si mesmo? Em Atenas, o filósofo só podia ser um cidadão, livre, pois o trabalho braçal era função dos escravos e a atividade de filosofar só se concretizava através do ócio. O sacerdócio, por exemplo, é o ócio sagrado. Nesse contexto podemos perceber que o ócio também possui uma função positiva na medida em que ele permite a reflexão, o “parar para pensar”. Portanto, o ócio e o trabalho devem coexistir. É no trabalho que podemos nos tornar úteis para a sociedade e é no ócio que podemos refletir acerca do nosso trabalho, do mundo e de nós mesmos.

Enquanto estivermos associando a “falta de tempo” e, portanto, o excesso de trabalho à dignidade, não teremos tempo para o ócio. Não teremos tempo para a reflexão. Ou seja, estaremos refletindo muito pouco enquanto o “não tenho tempo” for uma boa desculpa, a melhor desculpa de todas.

Um comentário:

  1. porra tu é uma bixa em mermaooo!
    ssiashiuhsuas parabens!!!
    abraçao
    zelinho

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