terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A Cura de Dexter

AVISO: Procurei redigir a minha interpretação do seriado evitando ao máximo os spoilers. Somente recomendo que você não leia caso não tenha visto nem a primeira temporada. Nesse caso, recomendo que assista a primeira temporada e volte para a leitura.

Quando assisti Dexter pela primeira vez, em 2006, em sua primeira temporada, tive a sensação de que esse seriado faria muito sucesso. Na época, soube de poucas pessoas que assistiam. Hoje, a minha sensação se confirma quando cada vez mais gente começa a assistir o seriado, seja comprando os box’s ou baixando da internet desde sua primeira temporada.

Sumariamente, Dexter é uma série, baseada num livro chamado Darkly Dreaming Dexter, de Jeff Lindsay, que conta a história de Dexter, um serial killer. Com todo cuidado que devemos tomar ao tratar de patologias da área da psicologia e da psiquiatria, afinal, esses transtornos possuem as suas complexidades e particularidades, nem sempre retratadas tão fielmente em obras de ficção, podemos dizer que, no caso de Dexter, ele é um psicopata, pois ao sofrer um trauma de infância, é incapaz de ter os mais variados sentimentos com relação a outras pessoas. A psicopatia se apresenta como um distúrbio que afeta suas emoções, fazendo com que ele não sinta remorso, nem culpa. Mais do que isso, Dexter seria “insensível”, não desenvolveria empatia e, portanto, seus laços sociais seriam forjados. Além disso, Dexter possui uma necessidade de matar.

Ao observar a infância de Dexter, seu pai, Harry, que era um policial muito respeitado na corporação, percebe que o filho possui os traços de um psicopata quando esse mata animais sem qualquer tipo de sentimento. Aqui, a crueldade do psicopata (apenas uma parcela de psicopatas são serial killers), se manifesta na sua capacidade de realizar atos cruéis sem qualquer tipo de remorso. Sendo policial, Harry procura, em segredo até da própria família, direcionar a patologia de Dexter para o “bem” através de um conjunto de regras. A partir daqui, como Dexter tem a necessidade de matar, ele só fará isso com quem “merece”, funcionando como uma espécie de anti-herói. Sendo assim, Dexter só matará outros assassinos e será, no limite, um “serial killer de seriais killers”.

Nesse ponto é que o seriado fica realmente interessante. Após a morte de Harry, Dexter segue as regras do pai à risca e procura forjar para si mesmo uma vida “normal”. Trabalha justamente para a polícia sendo quase que um legista, um perito em analisar cenas de crime, principalmente envolvendo sangue, aproveitando essa posição para investigar seus alvos. Sai com os colegas de trabalho, arranja uma namorada. Mas, no fundo, por ser um psicopata, o único sentido que ele vê em todas aquelas relações sociais é o disfarce de seu dark passenger, nome que ele dá à sua natureza psicopata, secreta e sombria. Em outras palavras, Dexter disfarça uma vida corriqueira, com todas as relações e rituais que lhe são característicos, para não ser pego.

Tudo vai muito bem com Dexter seguindo as regras do pai até que, em diversas situações, temporada após temporada, Dexter é levado a diversos conflitos que lhe farão questionar essas regras e até mesmo quem ele é. E que conflitos são esses? Justamente os conflitos que sua vida “normal”, que ele achava ser somente um disfarce, lhe impõe. Dexter é levado a sofrer nossos dramas mais cotidianos, a encarar nossos conflitos, envolvendo a irmã, a namorada, a família e os amigos. Por ser estranho a esse mundo que nos é corriqueiro, Dexter acaba exacerbando tais conflitos e se tornando cada vez mais humano, cada vez mais “normal". É justamente a dialética que se estabelece entre sua vida de psicopata, que ele considerava a única verdadeira, sua natureza, sua essência, e sua vida “normal”, vida essa que ele vai descobrindo não ser somente um disfarce, mas sim a sua própria gradual e explosiva cura, é que torna esse seriado, tão aparentemente cruel, extremamente sensível e humano. O amor, a amizade, a religiosidade e tantas outras coisas que para nós são corriqueiras, acabam por ser justamente o cerne dos conflitos do protagonista.

Se algumas características de Dexter não condizem com as patologias reais, ou se essa cura que ele vem desenvolvendo no decorrer da série não é possível na realidade, isso não importa. Dexter não está só propondo uma compreensão da psicopatia. Mais do que isso, Dexter nos convida para uma maior compreensão de nós mesmos. Somos colocados no lugar do protagonista para vermos de outra perspectiva nossas próprias vidas, nossos próprios dramas que, ao olhar de Dexter, que se tornará o nosso olhar através da série, são exacerbados e desbanalizados. Dexter nos auxilia a contemplar nossa humanidade através de um olhar exterior e aparentemente insensível, mas que no fundo reconhecemos porque é humano. Ele é o psicopata que vai se tornando humano através dos mesmos dramas pelos quais nos tornamos humanos também. A cura de Dexter se revela ao passo em que ele encara nosso cotidiano, a nossa condição humana. A cura de Dexter, aquilo que o torna cada vez mais "humano", é também a nossa cura.

Um comentário:

  1. Oiiee! Nossa que saudades! Talvez voce nem saiba mas volte e meia vejo que vc posta e estou aqui acompanhando seu blog! Como fã de dexter há tempos vim me manifestar que esse post (assim como tantos outros) ficou excelente! Voce ainda vai ser famoso por escrever tão bem... =D
    parabens pelo blog! Beijao!

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